Há pouco tempo se descobriu a força do storytelling, apesar dele existir em nosso convívio desde que nascemos. A contação de histórias ultrapassou o limite do cinema e dos livros infantis e, desde então, essa técnica passou a ser usada como ferramenta de trabalho nas áreas de comunicação. É uma forma apelativa, que utiliza da emoção para persuadir o público alvo e chamar atenção, seja no jornalismo, podendo ser chamado de jornalismo literário, ou na publicidade. Fabiano Ormaneze, professor da faculdade de Jornalismo da PUC-Campinas desde 2008, na área de narrativa, discurso e semiótica, é o entrevistado para contar mais sobre como o storytelling pode ser trabalhado nessa área. Ormaneze é autor, entre outros, do livro “Do jornalismo literário ao cientifico: biografia, discurso e representação”, da Editora Pontes, Mestrado pelo Laboratório de Assuntos Avançados em Jornalismo (LabJor), da Unicamp, e está Doutorando em Linguística pela mesma instituição.
A contação de histórias como forma de ensinar algo sempre existiu. De um tempo para cá, porém, a comunicação – jornalismo, publicidade, marketing – parece ter “descoberto” essa ferramenta. Por que, na sua opinião, o storytelling ganhou tanto corpo nos últimos anos?
O campo das comunicações passa por uma busca de novas identidades e formas narrativas, para dar conta dos desafios contemporâneos. Há um notável crescimento de pesquisas e de bons resultados no mercado de comunicação que comprovam a eficácia do storytelling para divulgar seus produtos. O crescimento desses casos de sucesso, o aumento do número de pessoas que estudam a questão e, sobretudo, o fato de o storytelling estar na nossa história de vida desde a infância, fazem com que a prática se mantenha e ganhe novos adeptos. O storytelling possibilita ainda que você consiga promover uma experiência aliada à informação que está recebendo. Essa experiência diz respeito à identificação com a história, as sensações e sentimentos que ela transmite, a possibilidade de produzir sentidos.
De que maneira contar uma história de forma mais humanizada e próxima é benéfica para o jornalismo?
Uma história humanizada promove identificação nas pessoas que compartilham dos mesmos valores, que estão na mesma formação discursiva. Dessa forma, quem lê/acompanha a história vê-se representado de algum modo nos personagens. Além disso, a história de vida serve para trazer assuntos áridos para mais perto do espectador. Isso facilita, inclusive, a compreensão. Um bom exemplo são assuntos relacionados à economia, que, em geral, parecem distantes da maioria das pessoas, mas conseguem ser próximos se vierem explicitados a partir do impacto no cotidiano.
Nós temos visto que o jornalismo tem se transformado. Na TV, repórteres usam barba, apresentadores exibem tatuagens e abandonaram o tom solene e até mesmo sisudo da notícia. No impresso, o texto ganhou leveza e o lead perdeu força para narizes de cera que colocam o leitor no centro da história. Esse é um caminho sem volta?
Eu discordo que o lead tenha perdido força para o nariz-de-cera, que diz respeito a um jornalismo ultrapassado. O impresso perde espaço no formato tradicional, mas temos os jornais de distribuição gratuita, em diversos países, que conseguem uma boa quantidade de leitores e uma receita publicitária alta. O jornalismo de TV está cada vez mais popular e isso, de modo geral, é uma das razões pelas quais se tem esse tom mais natural, menos formal, mas também, a meu ver, empobrecido em termos de conteúdo. Não podemos dissociar o jornalismo do nível educacional. A diminuição do interesse, a busca por informações mais populares e a redução no número de leitores têm a ver muito com a baixa escolaridade e o nível deficitário de educação que temos no Brasil. Há países europeus, por exemplo, em que jornais impressos tiveram aumento em suas tiragens nos últimos anos, mas eles têm como diferencial um sistema educacional muito eficaz. O jornalismo sempre passará por alterações. O formato que chamamos hoje de clássico, num tom mais formal, também já é uma alteração em relação ao jornalismo que se praticava, por exemplo, no final do século 19. O jornalismo faz parte da história e, como tal, estará sempre sujeito às condições de produção e à ideologia.
O jornalismo, por meio do storytelling, está se tornando mais “participativo” do mundo do que meramente um observador imparcial?
O jornalismo está se transformando em mais participativo por uma série de questões, inclusive, em função das inovações tecnológicas e das plataformas utilizadas, que possibilitam a interatividade. O storytelling é apenas mais um dos recursos que possibilitam a participação, principalmente, porque uma história pode ser o tempo todo complementada com outras informações, que transformam o leitor naquilo que chamamos de prosumidor, um termo que tem origem no inglês “prosumer”, e que define esse leitor que, ao mesmo tempo que consome, produz informações. Isso também pode ser perceptível por meio de compartilhamentos em redes sociais digitais, em narrativas que diariamente cada usuário da web produz sobre si mesmo e sobre os outros. Somos todos contadores de histórias, o tempo todo.